A Ordem dos Médicos Dentistas (OMD) quer que o Governo defina uma verba no orçamento do Ministério da Saúde para a Saúde Oral. Ao longo de quatro dias, o bastonário da OMD visitou mais de uma dezena de unidades de cuidados de saúde primários, de norte a sul do país, para conhecer a realidade dos médicos dentistas que trabalham no Serviço Nacional de Saúde.
O roteiro ‘Medicina Dentária no SNS’ detetou falhas e descoordenação nos serviços, materiais obsoletos e sem manutenção, doentes em estado calamitoso. Para a OMD, o projeto do Governo ‘Saúde Oral para todos’, que previa a inclusão de pelo menos um médico dentista em todos os centros de saúde do país, falha em toda a linha.
O bastonário da OMD, Miguel Pavão, revela que “há apenas 135 médicos dentistas a trabalhar no SNS. As promessas do Governo ficaram na gaveta. A pandemia não explica nem justifica tudo. Ao contrário de outras áreas médicas, a saúde oral não tem sequer um orçamento atribuído no Ministério da Saúde. Não há qualquer plano de investimento. A maioria dos médicos dentistas trabalha para o SNS como prestadores de serviços, contratados por empresas, sem vínculo laboral. Os prejudicados são os doentes que não têm um acompanhamento próximo e regular como no privado.”
No roteiro pelo país, o bastonário da OMD foi confrontado com várias soluções de recurso para a contratação de médicos dentistas. Apenas um número muito reduzido integra os quadros, e, como a maioria dos médicos dentistas é contratada por empresas, a rotação é enorme.
A OMD defende a criação de unidades de saúde oral em todos as Administrações Regionais de Saúde e o alargamento das condições para a população aceder às consultas de medicina dentária, restritas atualmente a pessoas com grave incapacidade económica e com limite de tratamentos disponíveis.
Para Miguel Pavão, “o mais chocante são os relatos dos médicos dentistas sobre pessoas que nunca tinham ido a uma consulta de medicina dentária, pessoas muitas delas idosas, algumas sem dentes, com várias doenças agravadas pela falta de cuidados de saúde oral e até doentes com menos de 30 anos com todos os dentes cariados. É um cenário que pensávamos já ter sido ultrapassado em Portugal. O projeto do Governo restringe os doentes, que só têm acesso às consultas de medicina dentária por falta de recursos económicos, e limita os tratamentos a um número de intervenções que não permite responder à totalidade das necessidades dos doentes, apenas às mais urgentes.”
O bastonário Miguel Pavão desafia o primeiro-ministro e a ministra da Saúde a visitarem os médicos dentistas nos centros de saúde e a ouvirem profissionais e doentes, e considera “urgente criar parcerias público-privadas para a saúde oral. O Governo tem de deixar de lado as questões ideológicas, na saúde o mais importante são os doentes, garantir que acedem às consultas e tratamentos que precisam, isto não acontece na saúde oral”.
Miguel Pavão sublinha que “o nosso objectivo é garantir que todos os portugueses, sem exceção, têm resposta às suas necessidades de saúde oral. Para tal, é necessário elaborar um plano de ação e dotá-lo dos meios necessários para ser implementado e cumprido na íntegra. Isto só se consegue com meios, humanos e financeiros. Agora que o Orçamento de Estado para o próximo ano está em discussão, apelo a todos os partidos com assento no Parlamento que, no debate na especialidade, obriguem o Ministério da Saúde a alocar verbas para a saúde oral de forma a garantir que em todos os centros de saúde são criadas unidades de saúde oral. Porque sem cuidados de medicina dentária nenhum português poderá ser saudável.”
A OMD critica a postura que tem sido seguida pelo Ministério da Saúde de apostar no tratamento e não na prevenção da doença, o que pouparia milhões de euros no médio e longo prazo aos contribuintes.
Miguel Pavão considera que “o Governo ainda vai a tempo de aproveitar o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) para investir na saúde oral. As verbas do PRR oferecem uma oportunidade única para o país se desenvolver e a área da saúde é, nesta altura, das que mais precisa de investimento. Dotar o SNS de capacidade efetiva em medicina dentária tem de ser prioridade. Já desperdiçámos 40 anos. O SNS nem sequer tem uma carreira para a medicina dentária. Os médicos dentistas esperam há anos pelo aval do Ministério das Finanças.”