A Ordem dos Médicos Dentistas (OMD) está preocupada com o efeito que a nova tabela de preços do regime convencionado da ADSE vai ter na qualidade dos serviços prestados.

Apesar do processo de revisão da tabela da ADSE ter demorado vários meses e ultrapassado os prazos estipulados, a nova tabela da ADSE não segue a tabela da nomenclatura da medicina dentária que está em vigor desde que foi publicada em Diário da República em 2014, e que tem de ser seguida obrigatoriamente pelos profissionais de saúde oral.

A OMD enviou no verão do ano passado várias sugestões de acertos na tabela da ADSE, mas nunca obteve resposta.

Na nova tabela que a ADSE pretende impor, há atos médico-dentários com valores que podem ficar abaixo do custo real, o que pode configurar uma situação de ‘dumping’, uma prática ilegal.

Miguel Pavão, bastonário da OMD, considera que “há casos em que é muito difícil conciliar os valores impostos pela ADSE e os custos reais de materiais e procedimentos. Receamos que a qualidade dos atos médico-dentários venha a estar em causa se não forem feitas alterações. Um simples exemplo é o que se passa com pandemia da Covid-19, que trouxe custos acrescidos com protocolos e equipamentos de proteção individual, os famosos EPIs, que nem sequer estão incluídos na tabela da ADSE. As consultas de medicina dentária requerem cuidados e materiais especiais devido à proximidade com os doentes e é impossível na atual conjuntura ignorar os riscos do vírus SARS-CoV-2”.

Se a nova tabela da ADSE for cumprida à risca há doentes que vão ficar com tratamentos a meio e há doentes que vão ter cáries a evoluir sem poderem ser intervencionadas.

 

 

A nova tabela da ADSE refere que “por tempo de consulta/clínico são comparticipados até um máximo de 2 códigos de atos médico-dentários, limite a partir do qual será necessário submeter a Autorização Prévia.” Para a OMD trata-se de uma inaceitável ingerência, até porque, em pacientes com patologias associadas, a realização de múltiplos tratamentos no mesmo tempo de consulta é desejável e recomendado.

A OMD considera ainda inaceitável a limitação de atos clínicos por dente/doente/ano porque não só interfere na independência do médico-dentista, mas também porque coloca em causa a saúde e bem-estar dos pacientes.

Por exemplo, um paciente que faça uma restauração a uma cárie num dente e a quem passados dois anos é diagnosticada uma outra cárie no mesmo dente, só poderá efetuar nova restauração quando se cumprirem 5 anos sobre a data da primeira restauração. Se esta regra for seguida, a cárie vai continuar a evoluir conduzindo inevitavelmente a tratamento endodôntico, reabilitação com recurso a uma coroa ou, em última instância, à própria extração do dente. Ao aumento de custos monetários pelos tratamentos mais complexos e demorados, acresce um custo na saúde do paciente que poderia resolver a situação com uma simples restauração.

A OMD destaca ainda que os preços atribuídos na nova tabela da ADSE nem sempre apresentam relação com a complexidade, tempo e custos associados aos tratamentos envolvidos. Um exemplo é o item referente à “Destartarização Bimaxilar” que apresenta um valor total de 20€, enquanto o item “Destartarização Bimaxilar e curetagem subgengival” tem um valor absoluto de 30€. Isto significa que se está a atribuir um valor de 10€ a um procedimento como a curetagem subgengival, que é muito mais complexo e consumidor de tempo, de materiais, recursos e conhecimentos técnicos do que uma destartarização ultrasónica.

O bastonário da OMD lembra que “há um ano foi com grande esperança e otimismo que encarámos a revisão das tabelas da ADSE, que não sofriam alterações há muitos anos. Infelizmente perdeu-se uma oportunidade para melhorar e garantir um melhor serviço aos beneficiários da ADSE. Percentualmente, e porque se parte de um valor muito baixo, o aumento parece grande, mas, na prática, são aumentos simbólicos que não refletem quer a subida de preços de materiais nos últimos anos, quer a evolução dos procedimentos altamente diferenciados da medicina dentária.”

Uma restauração que, na anterior tabela, tinha um valor de 17,2€, sobe agora 45%, para 25€, um aumento de apenas 7,8€.

A OMD considera que a Entidade Reguladora da Saúde, a Autoridade da Concorrência e a Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões devem intervir e analisar as novas tabelas da ADSE para garantir que não há ‘dumping’ nos preços propostos, porque, para além de ilegal, um pagamento abaixo do valor de custo põe em causa a concorrência entre prestadores.

A OMD vai aguardar com atenção o desfecho deste processo, respeitando a decisão individual dos médicos dentistas na adesão ou rejeição desta nova tabela. Contudo, a OMD mantém o apelo na defesa da saúde pública, da qualidade dos cuidados médico-dentários prestados pelos médicos dentistas aos cerca de 1,3 milhões de beneficiários da ADSE, garantindo a ética médica e preservando a autonomia de decisão e princípios consagrados no estatuto dos médicos dentistas.