Estimados colegas,

Após ter cumprido cinco mandatos como bastonário da Ordem dos Médicos Dentistas (OMD), venho agradecer a confiança que me demonstraram em todos os momentos, incluindo os mais difíceis, como aconteceu recentemente com a paragem forçada da nossa atividade profissional ainda antes e durante a vigência do estado de emergência.

Foi para mim uma enorme honra ter dedicado essa parte substancial da minha vida a realizar o dever de defender a nossa classe, quer dentro do País quer nos diversos fóruns e confederações internacionais em que tive funções dirigentes.

Nestes momentos de mudança, é fundamental que aqueles que tiveram responsabilidades pelo que fica feito apresentem um balanço do que fizeram. Neste caso, do que fizemos durante quase 20 anos.

De então para cá, foi possível:

  • Aumentar a acessibilidade da população à saúde oral de cerca de 15%, em 2001, para mais de 60%. Para tal, os médicos inscritos na OMD (atualmente cerca de 11 mil no ativo em Portugal) revelaram-se fundamentais. E, todos juntos, conseguimos:
    • Na prática privada da profissão, integrados numa rede de cerca de seis mil clínicas e consultórios de medicina dentária, que cobrem 97% do território nacional;
    • Com a ajuda do programa cheque dentista, 3,5 milhões de portugueses acederam a consultas de medicina dentária;
    • E, recentemente, com a integração de cerca de 120 médicos dentistas no SNS, um número que deverá crescer para mais de 300 até ao final da presente Legislatura.
  • Atingir o reconhecimento pleno da medicina dentária como uma profissão médica, e dos médicos dentistas como ”médicos de saúde oral”, alargando o seu papel e a sua intervenção na sociedade, mediante a introdução de especialidades e de competências em medicina dentária.
  • Combater com êxito a, então, elevadíssima taxa de exercício ilegal da profissão.
  • Licenciar e certificar o universo de consultórios e clínicas dentárias a operar.
  • Criar um Observatório de Saúde Oral, que permitiu estudar e promover a profissão e a saúde oral através de barómetros, campanhas e estudos, que proporcionaram visibilidade pública e se revelaram eficazes e promotores de políticas de saúde pública mais efetivas.
  • Integrar na sociedade portuguesa o conceito de Saúde Oral / Saúde Geral, um contributo essencial para a qualidade de vida dos portugueses.
  • Implementar Formação Contínua tendencialmente gratuita para todos os médicos dentistas.
  • Afirmar o Congresso da nossa Ordem como um dos maiores e mais prestigiados da Europa.
  • Implementar Especialidades e regulamentar Competências na medicina dentária.
  • Neste período, inquestionavelmente, projetamos a nossa profissão de forma efetiva e torná-la relevante, que ao nível social quer nas plataformas de decisão pública,

A nível nacional, enquanto bastonário da nossa Ordem, foi possível ocupar lugares de destaque e de prestígio para todos nós:

  • Na Presidência do CNOP, Conselho Nacional das Ordens Profissionais;
  • No Comité Económico e Social;
  • Em inúmeros grupos de trabalho e fóruns de diálogo com agentes políticos e da sociedade civil de uma forma geral.

E também a nível internacional, através da participação ativa nos organismos representativos mais da profissão, designadamente:

  • Na Presidência e Comités da Federação Dentária Internacional;
  • Na Presidência e Comités do CED, Conselho Europeu de Dentistas;
  • Na Presidência de FEDCAR, Federação dos Reguladores Europeus da profissão;
  • Em diversas Parcerias estabelecidas com os países de língua e expressão portuguesa, em especial o Brasil.

Os médicos dentistas e a medicina dentária portuguesa são hoje reconhecidos automaticamente na União Europeia e considerados como profissionais valorizados a nível global.

Afirmo, com orgulho na profissão, que a medicina dentária praticada no nosso país ultrapassa em muito os limites das nossas fronteiras. Somos uma área de vanguarda, reconhecida como produtora de conhecimento e de mais-valias para Portugal.

Com cerca de 96% dos seus membros a exercer essencialmente no setor privado, num País em que o sistema público de saúde foi esquecendo, durante muitos anos, a saúde oral como área fundamental para a saúde pública, que o é. Nesse sentido, a OMD teve intervenção constante junto dos decisores públicos, criando uma lógica de permanente negociação visando defender a profissão, os médicos dentistas e as populações ou, tantas vezes, evitando que medidas danosas ou políticas erradas fossem implementadas.

Tal como outras profissões liberais, nestes últimos 20 anos, enfrentamos desafios muito difíceis:

  • A desregulação económica da profissão, decorrente da globalização;
  • A crise económica da crise do subprime e a subsequente intervenção da Troika;
  • A emigração daí decorrente de médicos dentistas, grande parte das vezes forçada, nomeadamente no espaço europeu;
  • O excesso de formação pré-graduada que interfere na oferta de serviços;
  • E, mais recentemente, a crise resultante da pandemia COVID-19, que obrigou à suspensão da atividade durante cerca de 45 dias.

Mas, esta profissão é resiliente, os seus profissionais são bem preparados e muito capazes, e as pessoas precisam muito dela.

Queria, nestes momentos finais das minhas funções de bastonário, deixar um agradecimento especial a todos os que comigo caminharam nestas quase duas décadas, quer integrando os órgãos sociais quer através da sua participação nas muitas iniciativas e atividades da nossa Ordem.

Em conjunto, deixamos o legado que mais nos deve orgulhar – uma Ordem respeitada, sempre ouvida, exemplarmente gerida, com um corpo de funcionários e colaboradores leais, dedicados, competentes, incondicionais na sua entrega, que constituem uma enorme mais valia no dia a dia da Instituição. Constituem-se, autenticamente, no motor desta Ordem.

E, numa altura de crise generalizada do país, das instituições e das empresas, quero realçar o facto de deixarmos uma Ordem económica e financeiramente muito robusta, com disponibilidades e excedentes financeiros mais do que suficientes para enfrentar o que por aí possa vir, por pior que possa ser. Num país em que a falta de recursos financeiros sempre pauta o funcionamento das suas instituições, peço-lhes que me permitam a veleidade de exibir um especial orgulho neste facto importante para todos nós, porque sem uma Ordem financeiramente saudável, a nossa profissão não teria quem a pudesse defender eficazmente.

Assim, nestes momentos finais de exercício de funções que por tantos anos mantive, quero dizer-vos que saio por vontade própria, com a noção plena de ter servido a Ordem dos Médicos Dentistas e a profissão com o melhor do meu esforço, com as minhas qualidades e limitações, ciente de que cometi inevitáveis erros, de julgamento, de perceção, de seleção de um outro membro das minhas equipas, mas, sobretudo, com a consciência do dever cumprido. Até ao último momento.

Deixo uma Ordem com maturidade, que respeita o seu passado e o assume.

Desejo ao meu sucessor, o colega Miguel Pavão, bem como à sua equipa, as maiores felicidades para o mandato que agora se vai iniciar. Declaro a total disponibilidade para com ele e a nossa Ordem colaborar na medida do que se entender adequado, mormente na passagem de testemunho que ocorrerá no próximo dia 18 de julho.

O seu sucesso será, certamente, o da profissão e de todos os médicos dentistas.

Muito Obrigado!

O bastonário
Orlando Monteiro da Silva